É normal pensar primeiro em si que no outro?
Imagine que você está viajando de avião e, de repente, um comissário de bordo anuncia que acabou de ocorrer uma despressurização na aeronave e que os passageiros devem colocar a máscara de oxigênio que cai à sua frente. Ao seu lado, está sentado um jovem com os dois braços engessados. Mesmo percebendo seu desespero, você coloca primeiro sua máscara e só então o ajuda.
Com esse gesto você pode ser considerado egoísta, uma vez que primeiro pensou em si mesmo e depois no outro? É claro que não, você foi previdente e correto. Seguiu o procedimento padrão, orientado pelos próprios tripulantes antes de o voo começar. Primeiro ajude-se, pois, se tentar ajudar o outro antes, poderá sentir-se mal e comprometer a segurança de ambos.
Essa pequena norma de segurança aérea é uma espécie de metáfora da vida. Cuidar de si mesmo antes de cuidar do outro tem um quê de altruísmo. Ao cuidar de nós mesmos, tiramos do outro essa responsabilidade e, ainda por cima, ficamos bem para ajudar quem precise. Mas, se após ajustar sua máscara sobre o nariz e a boca e recuperar a respiração normal, você não se interessar em auxiliar seu vizinho de viagem, não será apenas um egoísta, mas um omisso.
E é justamente nesse pormenor (ou seria um “pormaior”?) que reside a diferença entre dois tipos de egoísmo. Há o egoísmo normal, e até ético, da pessoa assumir a responsabilidade por si mesma, por sua segurança e pela solução de suas necessidades fundamentais; e há o egoísmo mau, patológico, próprio da pessoa que não demonstra interesse pelo outro. Este não pensa primeiro em si, mas só em si.
Egoísmo é diferente de egocentrismo e de individualismo?
Egoísmo e egocentrismo podem ser parecidos, mas não são a mesma coisa. Egocentrismo é inato. Todos nós nascemos voltados para o próprio umbigo, ao passo que o egoísmo vem mais tarde, quando reconhecemos a existência do outro. O velho avarento se assemelha à criança mimada: o pimpolho deixa você “chupando o dedo” enquanto lambe o pirulito na sua frente. Já o adulto deixa você “com as mãos abanando” enquanto contabiliza os ganhos nas suas costas.
De acordo com os estudos da psicologia do desenvolvimento, todo bebê é egocêntrico porque não tem com quem se comparar a não ser com ele mesmo. É natural que se considere o centro do mundo, pois ainda não tem a experiência de alteridade (não distingue nem reconhece a existência do outro). A criança vê a ela e à mãe como uma pessoa só. Até os 3 anos ela é assim, não se enxerga além de seus limites. “Mas isso é normal, é apenas um fator de desenvolvimento infantil pelo qual todos passamos”, afirma Márcia Reda, psicopedagoga. Como o bebê ainda não tem capacidade de julgamento moral, é esperado que ele defenda suas próprias necessidades e que se comporte, logo ao primeiro choro, como um mini egoísta. Os principais responsáveis por desprendê- lo do próprio umbigo são seus pais. São eles que delimitam o horário da amamentação, do sono, da brincadeira, do banho. E, à medida que o baixinho fica mais altinho, novos valores constroem-se de acordo com as experiências que vivencia e seleciona – o que deve ou não ser feito, se é certo ou errado, se é isto ou aquilo, se ele será egoísta ou generoso.
Existe egoísmo bom?
No século XVIII, o economista escocês Adam Smith já encarava o egoísmo como o motor locomotivo da sociedade. “Não é da benevolência do padeiro, do açougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu ‘autointeresse’”, escreveu Smith. Por esse raciocínio, todo bem social teria uma origem pessoal. Quando cada um que se esforça para proveito próprio acaba contribuindo para a coletividade.
Adam Smith acreditava que a livre competição não apenas acarretaria a queda do preço dos produtos como também promoveria inovações tecnológicas a fim de baratear o custo de produção e vencer os competidores. Dessa forma, o comerciante, movido apenas por seu próprio interesse egoísta (self-interest), é levado por uma mão invisível a promover algo que não faz parte de seu propósito original: o bem estar da sociedade.
Nenhum ato humano é totalmente desinteressado, gratuito. Nem o altruísmo. É esse impulso egoístico que move a mão para que o interesse coletivo seja realizado. Talvez seja por isso que a vida lembre a imagem de uma moeda rodando em torno de si mesma. Nesse caso, ela tem as duas faces, do egoísmo e do altruísmo. Ambos rodopiam entre si, oscilam, às vezes se mesclam e se fundem num só. De tempos em tempos sai cara: julgamos ser eternos, centramos desejos sobre nós mesmos. De tempos em tempos sai coroa: amadurecemos e passamos a crer que não vivemos apenas para nós mesmos, e sim para a humanidade à qual pertencemos.
Arquivo resumido tirado do sitehttp://vidasimples.abril.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário